Os Congressos, colóquios, simpósios e outros eventos académicos andam na moda. Além da benemérita função de engalanarem curricula, e de darem um trabalho danado a quem os organiza – falo por experiência de relapso e impenitente – dividem-se as opiniões sobre as suas demais virtualidades. Uns, acham que são perda de tempo, distracção das altas tarefas da investigação e/ou da docência; outros, exaltam a actividade como vera quintessência do saber.Penso que a verdade andará algures no meio dos encómios de concílio dos deuses da ciência, por um lado, e dos anátemas de vã e deletéria actividade excursionista, por outro.Há colóquios e colóquios, conferências e conferências. Certo é que muito se pode sempre aprende, se se estiver com atenção. Mas contra a atenção nestes fora militam várias coisas, infelizmente.A primeira é o compacto de informação, em pouco tempo. Os organizadores (e aqui vai também o meu mea culpa), normalmente por falta de verbas, concentram intervenções múltiplas em poucos dias, e o efeito é de ruído. Por isso é que tem de haver maus professores de vez em quando: para fazer os estudantes descansar das aulas dos bons, que são, como as boas conferências, naturalmente extenuantes.Outra razão é para mim um mistério agravado de falta de aprendizagem, precisamente onde aprender, e desde logo com os próprios erros, deveria ser normal: há sempre uma certa percentagem de oradores meio autistas, que levam para o púlpito ou para a mesa da presidência um papel sobre que pregam os olhos, e sem mais debitam, em monocórdica enchurrada de palavras, sem a mais pequena comiseração pelo público, um recado que assim muito ganharia em ser lido por um computador.Quando penso que as organizações de congressos gastam milhões em passagens de avião, hotéis, restaurantes e até, por vezes, num cachet que pode em certos casos ser razoável, para que tais matutos venham ler o que qualquer amador de teatro declamaria afinal muito melhor, penso nas vantagens da video-conferência, e mais ainda na falta de educação retórica em que todos vivemos. E não só em Portugal. O único país em que dificilmente recordo intervenções deste tipo é o Brasil. Aí, ler um papel num evento é já meia heresia, e seria heresia completa lê-lo mal, rotineiramente, sem expressão e consideração pelo público.Vim de um périplo grande de conferências, de Porto Alegre a São Paulo, de São Paulo a Londres. Com muitas coisas novas e boas na bagagem. Valeu a pena. Mas nem todos têm sorte nos seus congressos.Pouco antes, tinha estado em Atenas, onde um colega polaco me presenteou, num intervalo (aprende-se imenso nos intervalos dos congressos – alguns só valem mesmo por isso: mas não foi o caso) com um presente régio, que quero partilhar aqui. É uma verdadeira teoria dos congressos. Neste texto se resume toda a sabedoria sobre o assunto no plano crítico, embora não superando o romance académico Small World, de David Lodge. Um dia espero escrever uma Apologia dos Congressos. Mas isso depois de dar um tempo de descanso, porque já em Outubro e Novembro tenho mais uns tantos, e amanhã mesmo já mais uma conferência, e fora do Porto…Traduzo livremente, a partir da tradução francesa:“Como se sabe, os sábios dividem-se em duas categorias: estacionários e ambulantes. Os estacionários consagram-se como outrora a diversas investigações, enquanto os ambulantes participam em todo o tipo de conferências e congressos internacionais. Reconhecem-se facilmente os sábios da segunda categoria. No forro da sua roupa trazem um pequeno cartão de visita contendo o seu nome e títulos universitários, e têm sempre nos bolsos os horários das linhas aéreas. Utilizam cintos sem partes metálicas e mesmo as suas pastas têm fechaduras de plástico. (…) Estes sábios estudam a literatura especializada nos autocarros das companhias aéreas, nas salas de espera, nos aviões e bares de hotel. (…) As conferências científicas modernas devem também sofrer com a explosão demográfica. Sendo certo que o número futurólogos cresce à mesma velocidade que a totalidade da humanidade, a balbúrdia e a afluência reinam nos seus congressos. Não deveria pôr-se a questão de se proferirem oralmente a totalidade das exposições; cada um deve, assim, delas tomar conhecimento previamente. Contudo, não tivemos tempo para o fazer de manhã, já que os nossos anfitriões nos convidaram para beber um copo (…) (Stanislaw Lem, Le Congrès de Futurologie, Paris, Calman-Levy, 1976).Nunca fui a um congresso de futurologia. Mas consigo adivinhar…
pfc in "O Primeiro de Janeiro" de 27-09-2007
Sem comentários:
Enviar um comentário