domingo, 21 de abril de 2013

O ex-secretário-geral do PS acusa o Presidente da República de não saber ouvir a vontade dos portugueses, de dualidade na atuação face aos executivos de Passos e de Sócrates e de escolher momentos desadequados para intervir."O Presidente da República não tem sabido ouvir a vontade do país. Como se demonstra, nos últimos meses, a evolução tem sido dramática para o prestígio das instituições democráticas, não apenas do próprio Presidente da República, como do Governo e da Assembleia da República", aponta Ferro Rodrigues em entrevista à agência Lusa.
Entre outros pontos, Ferro Rodrigues discorda da interpretação de Cavaco Silva sobre os poderes presidenciais em relação à manutenção dos governos.
"Compreendemos quando diz que desde a revisão constitucional de 1982 há uma mudança nos poderes do chefe de Estado na relação do Presidente com o Governo. Mas, depois disso - e embora tenha havido algumas divergências com ele por parte de mim próprio -, o ex-presidente da República Jorge Sampaio utilizou os seus poderes presidenciais em determinado momento com generalizado aplauso da opinião pública", argumenta, numa alusão à queda do executivo de Pedro Santana Lopes no final de 2004.
Ferro Rodrigues entende que Cavaco Silva "está neste momento bastante mais envolvido nas políticas do Governo, o que é um pouco contraditório com aquilo que tem vindo a dizer".
"O Presidente da República não apenas alertou para a espiral recessiva que estava a fazer o seu caminho, como também mandou para o Tribunal Constitucional um pedido de fiscalização sucessiva [do Orçamento]. Há uma atitude que parece contraditória", aponta o ex-líder socialista.
O ex-secretário-geral considera ainda que "óbvio" que há "uma relação, pelo menos do ponto de vista público, bastante diferente entre o Presidente da República e este Governo e o Presidente da República, o mesmo, e o anterior Governo".
"Penso também que os silêncios quando se deve intervir e intervenções que não são adequadas quando se deve estar em silêncio não têm contribuído para um aumento do prestígio do Presidente da República. Ainda falta muito tempo para o seu mandato terminar e há que admitir que, compreendendo melhor os impasses que esta situação pode ter para a democracia portuguesa, o Presidente da República poderá mudar de rumo", ressalva Ferro Rodrigues.
Questionado se considera que foi o processo Casa Pia e a decisão do ex-Presidente da República Jorge Sampaio de nomear o Governo de Pedro Santana Lopes em 2004 os fatores que o impediram de ser depois primeiro-ministro, Ferro afirma que considera essas "etapas encerradas".
"É evidente que se pode especular o que teria acontecido neste ou naquele cenário, mas não passa de especulações, porque não foi feita a prova dos factos", argumenta.
O atual vice-presidente da Assembleia da República aceita que, caso não se tivesse demitido da liderança do PS em 2004 (dando depois lugar a José Sócrates), o percurso do país "teria sido certamente diferente".
"Mas sobre quais as diferenças e como, é possível fazermos um romance de ficção sobre isso, mas não nenhuma tese política a apresentar para doutoramento", refere, numa nota de humor.
Interrogado se teria sido um primeiro-ministro mais consensual do que José Sócrates, Ferro Rodrigues responde: "Essa questão não se pode colocar assim. Da prática política do ex-primeiro-ministro José Sócrates, entendo que houve muita coisa positiva. As pessoas são diferentes, mas não é altura neste momento de me pôr em bicos dos pés falando sobre o que é que teria acontecido há dez anos", alega.
Já quando questionado se perdoou a Jorge Sampaio não ter dissolvido o parlamento no verão de 2004, optando antes por nomear Santana Lopes primeiro-ministro, Ferro Rodrigues reagiu: "o verbo [perdoar] é excessivo".
"Neste momento, as minhas relações [com Jorge Sampaio] são normais. Encontramo-nos várias vezes por ano. Evidentemente que na amizade há também evoluções, há patamares diferentes e as coisas não se esquecem. Mas eu penso que hoje em dia tanto eu como ele nos consideramos amigos", refere

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