O dia em
que acabou a crise!
Partilho
convosco este magnífico texto de Concha Caballero. Convido-vos a tomarem
consciência da assustadora realidade, convido-vos a pensarem se este futuro que
está à porta é o futuro que querem para vocês, para os vossos filhos, para os
vossos netos. (Joaquim Furtado)
Concha
Caballero é licenciada em filosofia e letras, é professora de línguas e
literatura. Entre 1993 e 2008 ocupou um lugar no parlamento da Andaluzia onde
chegou a ser porta-voz do grupo Esquerda Unida.
“O dia em
que acabou a crise!
Quando terminar a
recessão teremos perdido 30 anos de direitos e salários…
Um dia no ano 2014
vamos acordar e vão anunciar-nos que a crise terminou. Correrão rios de tinta
escrita com as nossas dores, celebrarão o fim do pesadelo, vão fazer-nos crer
que o perigo passou embora nos advirtam que continua a haver sintomas de
debilidade e que é necessário ser muito prudente para evitar recaídas.
Conseguirão que respiremos aliviados, que celebremos o acontecimento, que
dispamos a atitude critica contra os poderes e prometerão que, pouco a pouco, a
tranquilidade voltará às nossas vidas.
Um dia no ano 2014, a
crise terminará oficialmente e ficaremos com cara de tolos agradecidos, darão
por boas as políticas de ajuste e voltarão a dar corda ao carrocel da economia.
Obviamente a crise ecológica, a crise da distribuição desigual, a crise da
impossibilidade de crescimento infinito permanecerá intacta mas essa ameaça
nunca foi publicada nem difundida e os que de verdade dominam o mundo terão
posto um ponto final a esta crise fraudulenta (metade realidade, metade ficção),
cuja origem é difícil de decifrar mas cujos objectivos foram claros e
contundentes:
Fazer-nos retroceder
30 anos em direitos e em salários
Um dia no ano 2014,
quando os salários tiverem descido a níveis terceiro-mundistas; quando o
trabalho for tão barato que deixe de ser o factor determinante do produto;
quando tiverem ajoelhado todas as profissões para que os seus saberes caibam
numa folha de pagamento miserável; quando tiverem amestrado a juventude na arte
de trabalhar quase de graça; quando dispuserem de uma reserva de uns milhões de
pessoas desempregadas dispostas a ser polivalentes, descartáveis e maleáveis
para fugir ao inferno do desespero, ENTÃO A CRISE TERÁ
TERMINADO.
Um dia do ano 2014,
quando os alunos chegarem às aulas e se tenha conseguido expulsar do sistema
educativo 30% dos estudantes sem deixar rastro visível da façanha; quando a
saúde se compre e não se ofereça; quando o estado da nossa saúde se pareça com o
da nossa conta bancária; quando nos cobrarem por cada serviço, por cada direito,
por cada benefício; quando as pensões forem tardias e raquíticas; quando nos
convençam que necessitamos de seguros privados para garantir as nossas vidas,
ENTÃO TERÁ ACABADO A CRISE.
Um dia do ano 2014,
quando tiverem conseguido nivelar por baixo todos e toda a estrutura social
(excepto a cúpula posta cuidadosamente a salvo em cada sector), pisemos os
charcos da escassez ou sintamos o respirar do medo nas nossas costas; quando nos
tivermos cansado de nos confrontarmos uns aos outros e se tenham destruído todas
as pontes de solidariedade. ENTÃO ANUCIARÃO QUE A CRISE
TERMINOU.
Nunca em tão pouco
tempo se conseguiu tanto. Somente cinco anos bastaram para reduzir a cinzas
direitos que demoraram séculos a ser conquistados e a estenderem-se. Uma
devastação tão brutal da paisagem social só se tinha conseguido na Europa
através da guerra.
Ainda que, pensando
bem, também neste caso foi o inimigo que ditou as regras, a duração dos
combates, a estratégia a seguir e as condições do armistício.
Por isso, não só me
preocupa quando sairemos da crise, mas como sairemos dela. O seu grande triunfo
será não só fazer-nos mais pobres e desiguais, mas também mais cobardes e
resignados já que sem estes últimos ingredientes o terreno que tão facilmente
ganharam entraria novamente em disputa.
Neste momento puseram
o relógio da história a andar para trás e ganharam 30 anos para os seus
interesses. Agora faltam os últimos retoques ao novo marco social: um pouco mais
de privatizações por aqui, um pouco menos de gasto público por ali e “voila”: A
sua obra estará concluída.
Quando o calendário
marque um qualquer dia do ano 2014, mas as nossas vidas tiverem retrocedido até
finais dos anos setenta, decretarão o fim da crise e escutaremos na rádio as
condições da nossa rendição.”
Este texto foi recebido por email. Não conheço a autora nem sei se o texto é mesmo dela. De qualquer modo, subscrevo.
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